quinta-feira, 18 de julho de 2013

João e Maria - Um conto de fadas moderno

Existe um ramo dos estudos da mente humana, a psicologia da arte, que defende que o uso de metáforas é a maneira mais fácil de se comunicar com uma criança, fazê-la se abrir e expor seus pensamentos...

Um conto de fadas moderno,


João nunca conheceu seus pais.

Tinha sido abandonado na rua, atrás da banca de jornal, dentro de uma cestinha de pão, com uma fitinha verde amarrada em seu braço e um bilhete escrito em letra muito caprichada: “Olá, meu nome é João. Minha mãe não tinha condições de me criar e me deixou aqui na esperança que alguém me dê uma vida melhor. Quem me encontrar, por favor, tome conta de mim”.

A noite, dois policiais que passavam por ali fazendo a ronda, ouviram um choro abafado e baixinho. Foram investigar e encontraram o João quase roxo com o frio que fazia. Consternados com a situação, levaram imediatamente a criança ao orfanato municipal.

Assim que chegaram, João foi colocado aos cuidados de Dona Maria, uma senhora já na casa dos seus 60 anos, responsável pela seção de bebês recém nascidos.

Nunca se soube quem eram os pais de João ou porque ele havia sido abandonado...

Passaram-se os anos e o menino cresceu. No orfanato, fez vários amiguinhos com seu jeito alegre e bonachão, era querido por todo mundo. João estudava com as freiras e voluntários que dedicavam seu tempo e trabalho às crianças sem lar.

Ele tinha uma vida feliz.

João sabia que havia sido abandonado por sua mãe, história que ouviu de Dona Maria quando lhe perguntou sobre seus pais, mas isso não lhe tirava o sono. Ele tinha amigos, estava estudando e o orfanato tinha brinquedos e doces. Do que mais precisava?

Um dia ele acordou e procurou o Pedro. 

Pedro, um moleque ruivo e sardento era seu melhor amigo, se conheciam desde criancinhas, cresceram juntos brincando e fazendo arte. Dona Maria teve muito trabalho com aqueles dois traquinas. Achou estranho não encontra-lo em sua cama, afinal, Pedro era um dorminhoco e João sempre passava por ali para acordá-lo para tomar o café da manhã, que era muito gostoso, sempre com pão quentinho e leite com chocolate. 

João adorava tomar café e conversar com as outras crianças, principalmente com o Pedro.

João procurou na sala, no corredor, no quintal, na cozinha... e não encontrava seu amigo. Começou a ficar preocupado.

Seu Moisés, que era o vigia do lugar, viu João com uma carinha triste e perguntou o que estava acontecendo.

- Seu Moisés, eu não encontro o Pedro, cadê ele? Ele saiu com as freiras? Aprontou alguma e está de castigo? Ou será que ele não gosta mais de mim?

O senhor de barbas brancas sabia o que tinha acontecido, mas preferiu chamar a Dona Maria que, cheia de candura, pegou o garoto no colo e lhe disse que o Pedro havia sido adotado e iria morar agora em uma casa nova, com uma nova família.

João que não entendia muito bem o que era esse negócio de "adotado" mas era muito inteligente, percebeu que não veria mais seu amigo. Ele desandou a chorar e, entre uma lágrima e outra, perguntou:

- Mas ele foi embora sem se despedir de mim?

Dona Maria o abraçou e afagou seus cabelos da forma mais carinhosa possível, mas João não conseguia se conformar com a perda do Pedro.

Depois daquele dia, muitos outros amiguinhos do João também foram embora. Mas as famílias, muitas delas cheias de dinheiro, roupas elegantes e sapatos brilhantes, nunca queriam adotar o João.

Nos dias das visitas ao orfanato, ele tomava banho, colocava sua melhor roupinha, um sorriso no rosto, e ia para o salão onde vários casais iam e vinham, conversando com a molecada, mas nada adiantava, sempre escolhiam outro menino ou menina.

E João ficava muito triste e, com o tempo veio o ressentimento. O que eu fiz que ninguém me quer? – Pensava o garoto. Já não comia nem dormia direito, se metia em brigas e, seu único conforto, eram os braços de Dona Maria, agora já bem velhinha e que sempre cuidou dele, desde seus primeiros dias no orfanato.

- João, não fique assim, você é um garoto de ouro, dizia ela, enquanto passava as mãos em seus cabelos e enxugava as suas lágrimas.

Dona Maria gostava muito de João, talvez por ele ter vindo pequenino, naquela noite fria, trazido pela polícia dentro do cesto de pão. O fato é que ela se afeiçoou a ele desde o primeiro dia...

João já estava quase dormindo e Dona Maria sentia uma sensação boa, de afeto e bem estar. Ao acariciar a cabeça de João, ela vê algo que nunca tinha notado antes. 

O garoto sempre usou uma franjinha que cobria sua testa e, naquele dia, cheia de espanto, ela descobre uma marca embaixo dos cabelos do menino. Ela sabia já ter visto algo parecido antes, mas não lembrava onde.

De repente Dona Maria solta um grito, se levanta e corre em direção ao seu quarto. João, que estava meio sonolento, acordou espantado.

- Dona Maria, aonde a senhora vai? O que aconteceu? Eu fiz alguma coisa?

Dona Maria não respondeu. Chegando ao seu quarto, abre uma caixa bem antiga, onde estavam diversas cartas, fotos e uns livros velhos e se pôs como uma louca a revirar tudo.

E joga livro pra cá, papel para lá, parecia que um furacão tinha passado pelo quarto.

Depois de algum tempo, Dona Maria encontra o que parecia uma fotografia. Depois de olhar por algum tempo para aquele pedaço de papel, ela desanda a chorar como uma criancinha.

João, que havia seguido a Dona Maria até o quarto, perguntou:

- O que eu fiz Dona Maria? Não chora por favor.

- Ah Joãozinho, eu sempre desconfiei , mas não tinha certeza até ver essa marquinha que você tem na testa.

João continuava perdido mas Dona Maria, entre lágrimas, falou:

- João, veja essa foto aqui, é você bebezinho.

João olhou a fotografia e viu um casal que ele não conhecia, segurando um bebe e uma mulher, que parecia filha da Dona Maria, olhando para a criança com candura.

- João, você é o filho de minha irmã, Matilde que morreu em um acidente quando você era bem pequeno. O ex-marido dela, seu pai, fugiu de casa com você logo após essa tragédia. Nunca mais tivemos notícias dele nem de você... Eu pensei que morreria sem te ver de novo... E você esteve aqui comigo, todo esse tempo...

Foi ai que João notou que o bebe da foto tinha a mesma marquinha que ele, bem visível, pois ainda não tinha cabelos na foto... E também percebeu que, realmente, ele tinha muitos traços e trejeitos da velha senhora. E se lembrou de tudo que tinha vivido até ali, de como Dona Maria tinha sido, para ele, a mão que ele nunca teve.

Naquele dia mesmo, Dona Maria e João fizeram um teste de DNA que comprovou o parentesco entre os dois e Dona Maria, toda feliz, levou o menino para viver com ela. 

E quem soube da história não acreditava! Parecia um conto de fadas daqueles que terminam com todos vivendo felizes para sempre...

Depois de tudo o que havia passado, João havia finalmente encontrado um lar e, Dona Maria, um filho...

2 comentários: